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sábado, 22 de junho de 2013

O Budista e a Cidadania


Ainda é bastante comum a ideia do típico budista como uma pessoa alheia aos acontecimentos, afastado de tudo o que diz respeito ao cotidiano e a sociedade, porque lhe interessa sobretudo uma certa 'espiritualidade'. Acredito que muito dessa visão é responsabilidade das próprias pessoas que se dizem budistas.

Você os conhece: fala mansa, olhar distante ou às vezes parecendo penetrante, ou uma aparência sonolenta que afeta o relaxamento, um permanente ricto à guisa de sorriso nos lábios; fala poeticamente ou por enigmas, 'koans' ou metáforas, e distribui a todos, muitas vezes sem ser solicitado, lições de moral e 'minutos de sabedoria'.

Costuma falar sempre em paz, não violência e compaixão. Você o conhece porque ele nunca cita as fontes das informações que prega. Acredita no 'ecumenismo' e na ideia de que 'tudo é válido'. Sua opinião é não ter opinião. Muitas vezes nada faz para esclarecer as distorções das informações que o senso comum possui sobre o budismo, uma vez que ele próprio admite as misturas, defendendo-as como uma espécie de 'insubstancialidade'. Não acredita em cânone, acha que a 'rigidez' e a 'ortodoxia' impedem a iluminação.

É normalmente aquele conhecido seu com um cavanhaque cuidadosamente tratado, ou o famoso 'cabeludo compreensivo', com uma camisa de Ganesha e chinelos fransciscanos. É a sua amiga 'ligada em cultura oriental': roupas e joias com temas do 'oriente', recitando 'mantras', praticante de 'yôga' ou dança indiana. É aquele pessoal que frequenta o 'gonpa' mas não deixa de visitar o templo dos Hare Krsna, o centro de umbanda e o terreiro do Santo Daime. Ser budista para eles significa vestir-se diferente, praticar uma religião 'exótica' onde se recitam misteriosas fórmulas numa língua 'diferente'. Significa nutrir um confuso conjunto de preocupações acerca da 'compaixão' e da 'ecologia'.

Nada mais longe da verdade.

Antes de tudo, o budista não é alheio nem descolado da realidade. Ao contrário, a prática budista move-o justamente ao contato consciente com a realidade. Dessa consciência nasce a percepção da ausência de substancialidade, da insatisfação e da impermanência inerentes a essa realidade.

É dessa consciência que nasce a renúncia ao 'mundano', não uma renúncia que permanece desejando os objetos de renúncia, mas oriunda do desapego a tais objetos, porque se sabe que em última instância estes são a causa, a raiz do sofrimento humano. A espiritualidade budista é neste sentido, 'pé no chão', 'olhos abertos'; o budismo é concentração e atenção.

Além disso, fica evidente que a ética e a moralidade budistas, conforme podemos contemplar nos ensinamentos são um verdadeiro guia da conduta da vida do homem e em consequência disso da vida daqueles com quem ele se relaciona e com a sociedade em geral. Tais princípios são, de fato, a fundação do caminho que conduz à iluminação.

O budista não só compreende isso como também se esforça para colocar tais princípios em prática. A consequência disso é que, no exercício de sua profissão, no trato com familiares e amigos, nas suas relações sociais o budista pode e deve contribuir para uma sociedade e um país melhores. Ele não necessita se fantasiar nem mudar roupas e mudar a língua para adentrar o caminho budista. Ele precisa praticar o caminho.

Um budista não deve enganar, corromper ou ser corrompido. Não deve escolher profissões que causem mal a outros seres. Espera-se que como membro da sociedade um budista não minta, não roube, não tenha uma conduta sexual inadequada. Deve se afastar do álcool e das drogas, e abster-se do consumo de carne.
Não é difícil perceber que a heroica atitude budista previne a possibilidade de muito conflito e sofrimento, e certamente pode auxiliar a sociedade a caminhar para melhor.

Autor: Luciano Mesquita - professor de História

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